Na última semana, Rio das Ostras foi sacudida por uma denúncia que, embora antiga em sua essência, causa escândalo por sua forma e extensão: a prática do nepotismo escancarado envolvendo vereadores e membros da Prefeitura. A reportagem do Jornal dos Municípios trouxe à tona uma realidade vergonhosa, ainda que infelizmente comum em muitas cidades brasileiras, onde o interesse público é constantemente atropelado pela conveniência política e pelos laços de sangue — ou de influência.
O documento enviado ao Ministério Público revela uma teia de nomeações de parentes para cargos comissionados que compromete diretamente a integridade da gestão municipal. Segundo a denúncia, sete parlamentares estariam envolvidos nesse esquema, transformando a máquina pública em balcão pessoal de favorecimentos.
Em meio à indignação popular provocada pelas revelações, chama atenção o total silêncio do prefeito Carlos Augusto Balthazar. Esperava-se, no mínimo, um posicionamento claro, uma promessa de investigação interna, uma medida imediata de afastamento ou correção — mas o que se viu foi o mais absoluto conformismo com a irregularidade. O silêncio, nesses casos, é mais do que cumplicidade: é desprezo pela consciência cidadã e pelos princípios basilares da administração pública.
A Constituição Federal é explícita em seu artigo 37: a gestão pública deve pautar-se pela legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência — princípios que são frontalmente atacados quando se permite que cargos públicos virem moeda de troca política. A nomeação de familiares fere não só esses princípios, mas também desrespeita a Súmula Vinculante nº 13 do STF, que proíbe expressamente a contratação de parentes nas esferas de poder. Ou seja, não se trata apenas de questão moral ou política — é, tecnicamente, uma ilegalidade.
Mais grave ainda é a constatação de que o município já havia firmado anteriormente um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) com o Ministério Público, comprometendo-se a não reincidir nessa prática. O rompimento desse acordo revela não apenas reincidência, mas também desrespeito institucional às limitações impostas por órgãos fiscalizadores, refletindo um padrão de conduta pouco comprometido com as exigências legais e éticas que a função pública exige.
Como se não bastassem os nomes já listados na denúncia, novos episódios continuam emergindo, demonstrando que o problema é sistêmico. Um dos casos mais comentados envolve Valdecy Pereira de Souza, nomeado para o gabinete do vereador Robson Carlos de Oliveira Gomes (Robinho). Valdecy é pai de Fabiana dos Santos de Souza, chefe de gabinete da Prefeitura. Informações de bastidores apontam que familiares de Robinho estariam sendo beneficiados com cargos distintos na administração — abrindo caminho para aquilo que popularmente se conhece como “troca de favores”. Há ainda denúncias que sugerem que Robinho goza de vantagens dentro da prefeitura, supostamente favorecido pela influência de Fabiana.
Esse tipo de relação promíscua entre Executivo e Legislativo compromete uma das premissas fundamentais da democracia: a independência entre os poderes. Quando vereadores se beneficiam de nomeações irregulares negociadas entre gabinetes, o que se destrói é a capacidade de fiscalização, a transparência nos atos públicos e, sobretudo, a confiança da população em seus representantes.
É imprescindível que o Ministério Público conduza uma investigação profunda, imparcial e implacável, com a devida responsabilização dos envolvidos. E é ainda mais essencial que a sociedade civil, a imprensa local e os cidadãos de Rio das Ostras acompanhem de perto cada desdobramento, cobrando explicações públicas e exigindo a reversão imediata dessas nomeações ilegais.
Rio das Ostras precisa ser reconectada à ética, à legalidade e à gestão pública voltada para o povo — e não para pequenos grupos de aliados. A cidade merece gestores comprometidos com o bem comum, e não representantes que tratam os cargos públicos como herança familiar ou instrumento de barganha política.
Denunciar é apenas o começo. O desafio maior é romper, de uma vez por todas, com a cultura de impunidade que sustenta esse tipo de prática. A indignação precisa virar ação. E a ação, por sua vez, precisa gerar transformação.